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O Sagrado na Dança

Publicado em 08/02/2013

O Sagrado na Dança

O sagrado na dança e o seu valor nos cultos afro-brasileiros 

Vamos iniciar aqui uma reflexão sobre movimento, dança e expressão corporal nas giras dos cultos afro-brasileiros, sua importância, suas matrizes e seus significados.

As danças se manifestam em cultos religiosos das mais variadas vertentes, sendo possível nos remeter as mesmas através dos registros históricos das religiões e cultos pagãos. Porém, nas religiões cristãs e nas suas diferentes manifestações contemporâneas também encontramos a dança como maneira de expressar, louvar e reverenciar a Deus.

Na maioria dos templos umbandistas e candomblecistas a dança está presente em boa parte do trabalho espiritual. Algumas pessoas podem ainda não ter percebido qual a real importância desta movimentação dentro do trabalho, dando margem a diversas interpretações e questionamentos.

Algumas justificativas comuns a cerca do assunto partem do principio da manutenção da cultura, afinal tanto o candomblé quanto a umbanda remetem diretamente a história dos povos afro-brasileiros que traz a dança como uma forte representação cultural, assim como a música.

Outra explicação comumente encontrada é que o ritmo musical faz com que as pessoas deixem seus corpos a vontade e com isso a dança surge, de maneira natural e sem maiores significados.

Vamos abordar agora um olhar, pouco menos apontado, mas que acreditamos ajudar no desenvolvimento de nossa caminhada dentro dos estudos sobre cultos afro-brasileiros.

A dança, assim como a música, a fala, o olhar e a gestualidade cênica, são linguagens. Nossa sociedade tende a valorizar e utilizar com mais intensidade as linguagens oral e escrita, contudo as demais linguagens não deixam de existir e de terem suas características próprias dotadas de grande poder de comunicação.

Sendo a dança e a música duas linguagens do ser humano, pode-se começar a pensar a respeito da presença das mesmas, como maneiras de comunicação entre os membros de uma corrente espiritual, encarnados, desencarnados e também como manipulação de energias.

A movimentação corporal, assim como os diferentes ritmos musicais, influencia a energia e interfere nas frequências rítmicas e cardíacas dos corpos, seja de quem dança e toca, como também de quem está envolvido no ambiente.

Mais especificamente a dança, com suas movimentações e expressões corporais, pode atingir níveis mentais e emocionais com uma facilidade diferenciada das demais linguagens. Ao trabalhar com os chacras e receptores sensoriais (em regiões corporais nas quais os receptores aparecem com mais intensidade ou menos intensidade), a transmutação energética ocorre, caracterizando assim, já um trabalho espiritual, sem a necessidade do uso da fala, outras linguagens e até mesmo outros paramentos.

Pode-se assim seguir o raciocínio e concluir que com uma dança no trabalho espiritual, momentos de descarrego, passe energético, e até mesmo consulta já estariam sendo realizados? Sim! O que nos faz crer que necessitamos desses momentos em particular, com o guia nos orientando verbalmente, cruzando nossos pés com pemba, utilizando de ervas em nosso benzimento e aspergindo água consagrada em nosso corpo é o nosso olhar acostumado para o trabalho espiritual convencional, que não está errado, pelo contrário, mas a necessidade, na verdade não existiria!

Até mesmo esta sequência relatada acima, se configura como uma movimentação corporal riquíssima, compondo uma dança se observarmos atentamente como os guias se porta, utilizando os corpos mediúnicos, para trabalharem: movimentação, expressão corporal e dança! Exercite seu olhar para isso quando tiver a oportunidade de assistir a uma gira. Veja quão maravilhoso é o dançar implícito nos movimentos “padrão” das giras.

Sobre as danças sagradas, próprias de cada linha ou de cada manifestação da energia dos orixás, sabemos que é possível ler estes movimentos, que nos trazem histórias e memórias. Da mesma maneira que um sábio preto velho nos orienta sobre nossas angustias com suas histórias de encarnações passadas, outros guias e manifestações das energias dos orixás nos aconselham nos remetendo as suas histórias contadas através do corpo que dança. O corpo que dança a coragem de encarar uma batalha, o corpo que dança a colheita, o corpo que dança a purificação nas águas límpidas, o corpo que capta do lodo a transmutação das energias em momentos de passagem... São diversas e inúmeras as possibilidades.

Algumas danças características das energias dos orixás já são de conhecimento da maioria dos frequentadores dos cultos. Pode-se facilmente reconhecer quando se dança para Oxum, quando se dança para Ogum e também quando há a manifestação da energia na linguagem corporal. Muitos são os pontos de identificação, porém um deles e talvez o de maior importância seja a postura das mãos. Através da postura e nível de energia das mãos e apenas nisso, é possível identificar o orixá que está sendo louvado ou canalizado. E porque será que é através das mãos que isso ocorre, se temos todo o corpo em movimento?

Mais uma vez podemos nos utilizar os saberes da ciência para entendermos isso. No nosso corpo existem pontos de maior concentração de receptores sensoriais, como já dito. Estes pontos conectam-se com nosso cérebro captando sinais físicos e do ambiente para serem processados e armazenados no córtex. Nossas mãos são pontos de grande concentração de receptores sensoriais. Temos outras regiões também muito sensíveis como a boca, olhos, ouvidos e pés, porém as mãos representam uns dos pontos mais sensíveis do nosso corpo. Sendo assim, fica fácil entender o quanto é possível ocorrer à expressão e a comunicação, bem como a representação de uma energia através da postura das mãos (mais firme, direcionada, leve, suave, etc.).

Nossa comunicação com o astral, com mundo espiritual está diretamente relacionada com a nossa energia e nossas emoções, o que se relaciona intimamente com nosso corpo (aceitamos aqui a concepção de que corpo e mente estão integrados e são indissociáveis). Assim sendo, podemos começar a observar com mais atenção e dar mais valor para as danças sagradas nos cultos afro-brasileiros, fazendo destes momentos de grande beleza, possibilidades de meditação, reflexão, transmutação, agradecimento e entrega ao sagrado que se manifesta.

Giuliana Marcellino





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