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A Trajetória de um verdadeiro zelador de Umbanda

Publicado em 07/08/2012


A trajetória de um verdadeiro zelador de umbanda

Sentado ali em frente ao seu congá, o velho pai de santo relembra com surpreendente nitidez sua infância e seu primeiro contato com a espiritualidade.

Nitidamente ele se vê na tenra infância a brincar sozinho no amplo quintal da casa de seus pais.

Lembra-se que alguma coisa o fez olhar para as nuvens e diante dele uma estranha imagem se forma: um velho sentado ao redor de uma fogueira e um menino a ouvir-lhe estórias. De alguma maneira o menino ao ver aquela cena sabia que se tratava dele mesmo.

O tempo passou e a cena jamais esquecida e também jamais revelada, o acompanha em sonhos e lembranças.

Cresce e acaba se tornando médium Umbandista.

Aos poucos vai conhecendo seus guias, que vão tomando seu corpo nas diversas "giras de desenvolvimento".

Primeiro o Caboclo que lhe parece muito grande e forte, depois os demais...

Até que, ao completar 18 anos, seu Exu também recebe permissão para incorporar.

Já não é mais médium de gira, a bem da verdade ocupa o cargo de pai pequeno do terreiro. Percebe que não tivera uma adolescência como a da maioria dos jovens que lhe cercam na escola.

Não vai a bailes, festas...

Dedica-se com uma curiosidade e um amor cada vez maior à prática da caridade.

Os anos passam e acaba por abrir seu próprio terreiro. Inúmeras pessoas procuram os seus guias e recebem um lenitivo, uma palavra de consolo e esperança.

Foram tantos os pedidos e tantos os trabalhos realizados que já perdera a conta.

Viu inúmeras pessoas que declaravam amor eterno pela Umbanda e bastava que alguns pedidos não fossem alcançados na plenitude desejada que já se afastavam, criticando o que ontem lhes era sagrado...

Presenciou pessoas que, vindas de outras religiões, encontraram a paz dentro do terreiro, mantido a duras penas, uma vez que nada cobrava pelos trabalhos realizados ("Dai de graça o que de graças recebestes").

Solteiro permanecia até hoje, pois embora tivesse tido várias mulheres que lhe foram caras, nenhuma delas aguentou ficar a seu lado, pois para ele a vida sacerdotal se impunha a qualquer outro tipo de relacionamento. Amava mesmo assim todas aquelas que lhe fizeram companhia em sua jornada terrena.
Brincava, o velho pai de santo, quando lhe perguntavam se era casado e respondia, bem humorado, que se casara muito cedo, ainda menino.

A curiosidade dos interlocutores quanto ao nome da esposa era satisfeita com uma só palavra:

Umbanda, este era o nome da esposa.

Com o passar do tempo, a idade foi chegando; muitos de seus filhos de fé seguiram seus destinos vindo eles também a abrirem suas casas de caridade. O peso da idade não o impede de receber suas entidades. Ainda ecoa, pelo velho e querido terreiro, o brado de seu Caboclo, o cachimbo do Preto-velho perfuma o ambiente, a gargalhada do Exu ainda impressiona, a alegria do Erê emociona a ele e a todos...

Enfim, sente-se útil ao trabalhar.

Hoje não tem gira.

O terreiro está limpo, as velas estão acessas e tudo parece normal. Resolve adentrar ao terreiro para passar o tempo, perdera a noção das horas. Apura os ouvidos e sente passos a seu redor, percebe que alguém puxa pontos e que o atabaque toca. Ele está de costas para todos e de frente para o congá. O cheiro da defumação invade suas narinas...

Seus olhos se enchem de lágrimas na mesma proporção que seu coração se enche de alegria. Estranhamente, não sente coragem ou vontade de olhar para trás, apenas canta junto os pontos. Fixa seus olhos nas imagens do altar, fecha os olhos e ainda assim vê nitidamente o congá, parece que percebe o movimento do terreiro aumentar.

Vira de costas para o congá e a cena o surpreende: vê Caboclos,Boiadeiros, Pretos Velhos, Marujos, Baianos, Erês e toda uma gama de Guias... Até Exus e Pomba Giras estão ali na porteira. Se dá conta que os vê como são, não estão incorporados. Todos lhes sorriem amavelmente.

Dentre tantos Guias, percebe aqueles que incorporam nele desde criança. Tenta bater cabeça em homenagem a eles, mas é impedido. O Caboclo, seu guia de frente, se adianta, lhe abraça, brada seu grito guerreiro... Os demais o acompanham. O velho pai de santo não agüenta e chora emocionado... As lágrimas lhe turvam a vista. Fecha seus olhos e ao abri-los todos os guias ainda permanecem em seus lugares embora calados...

Nota uma luz brilhante em sua direção, Iansã e Omulu se aproximam, seu Caboclo os saúda e é correspondido. A luz o envolve completamente.

Já não se sente mais velho.

Na verdade sente-se jovem como nunca.

Seu corpo está leve e ele levita em direção à luz.

Todos os guias fazem reverência...

O terreiro vai ficando longe envolto em luz...

Ele sorri alegre... A missão estava cumprida...

No dia seguinte, encontram seu corpo aos pés do congá.

Tinha nos lábios um sorriso...

( Autor Desconhecido)



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